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O MST e a função social da propriedade na prática

João Pedro Vieira, Jorge Forjaz, Tailane Morena

A posse de terras no Brasil, historicamente, é um fenômeno produto e produtor de exclusão. Desde a divisão territorial do país por capitanias hereditárias e o sistema de sesmarias, a posse de terra é privilégio de uma elite oligárquica ligada à monarquia, lógica esta oficializada com a Lei de Terras, ao conferir posse legal dessa terra invadida; constituindo, assim, a gênese dos latifúndios em um encadeamento legal e prático que viabilizou que aquele se tornasse o estrato social dominante. Naturalmente, se há um estrato social dominante, há também o dominado: lavradores que, sem direito de concessão de terras e sem recursos para adquiri-las, compunham o que se chamava Sem Terra; eram estes, ex-escravos e imigrantes europeus sem posses. Como fator inescapável do sistema de classes, havia uma impermeabilidade nessas camadas sociais que fadava essa população economicamente vulnerável a condição de sem terra, quase que inevitavelmente. É em um cenário como este que se faz necessária a existência de ferramentas de resguardo do bem estar social, e a que incide sobre a propriedade de terras é a função social da propriedade.

Como já embrionariamente preconizada nos critérios de distribuição de sesmarias, “não se deveria conceder uma terra maior do que a passível de ser realmente aproveitada”. Ainda que a prática desta resolução, à época, não tenha passado de mero artifício teórico e a terra ainda ser absolutamente restrita a grupos oligárquicos, já se mostrava um esboço do que deveria ser um limite para a concentração fundiária. O que tornou essa noção verdadeiramente palpável, no entanto, foram resoluções presentes na Constituição de Weimar, de 1919, ao estabelecer que o uso da propriedade deve ser condicionado ao bem estar social, prevendo que a lei deva promover a distribuição da propriedade de maneira justa e que garanta oportunidades iguais para todos. Quanto à aplicação destes conceitos às constituições brasileiras, a noção de função social social foi observada inicialmente em 1934, suprimida em 1937, retomada em 1946 e consagrada em 1967, mas se aproximando realmente à de Weimar apenas em 1988, ao incluir a função ambiental e prevendo expropriações em caso de não cumprimento.

Compreendendo então a função social da propriedade como um condicionante do direito à propriedade, para que se estabeleça legalmente que a propriedade privada não pode prevalecer em detrimento da sociedade, é necessário esclarecer que há particularidades referentes à propriedade rural e à propriedade urbana, quais sejam (como previstos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988):

“CAPÍTULO II – DA POLÍTICA URBANA 

Art. 182, § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.”

“CAPÍTULO III – DA POLÍTICA AGRÍCOLA E FUNDIÁRIA E DA REFORMA AGRÁRIA 

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”

Como ocorre em tantos aparatos da legislação brasileira, o que falta não é embasamento teórico ou mesmo determinação legal, mas implementação prática de medidas que, por si, seriam suficientes para resguardo e bem estar sociais. O cumprimento da função social da propriedade é direito do povo e dever do Estado, mas, como medida eficaz de descontinuidade de privilégios e ferramenta de equidade social, não é aplicada de forma eficaz na prática, se fazendo valer, basicamente, pela ação de movimentos sociais; é aí que entra a ação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ou MST.

Na época da ditadura militar no Brasil houve um estímulo à concentração de terras nas mãos de latifundiários, em um projeto de colonização que visava implementar agricultura em larga escala para viabilizar uma agenda de industrialização, com programas como o Proálcool. Esse foi o período de constituição do MST que, à medida em que agricultores familiares eram destituídos das terras das quais dependia seu sustento, se articulavam em prol do direito à terra, formalizando-se em 1984. Movimento de luta por terras e reforma agrária, reivindicava a soberania popular e justiça social, fazendo valer a função social da propriedade por meio de manifestações, negociações e ocupações de terras improdutivas.

Se a terra é instrumento necessário para a independência no sentido do trabalho, da produção e da vida, a educação também o é. Um ponto fundamental da atuação do MST é a atenção às necessidades educacionais em seus assentamentos. Têm como pauta fundamental a erradicação do analfabetismo, o que pressupõe a conquista de condições reais para que crianças e adolescentes tenham acesso à educação e, para isso, escolas de ensino fundamental e médio dentro dos assentamentos são parte essencial da luta. Além da luta pela emancipação dos trabalhadores por meio do espaço físico, é fundamental a libertação do pensamento, e a pauta educacional faz parte do trabalho de formação de consciência sociopolítica, da qual historicamente os trabalhadores foram destituídos. É com essa atenção que o Movimento conquistou que 100 mil crianças e adolescentes de seus acampamentos e assentamentos estejam na escola, além de um movimento massivo de alfabetização que contempla cerca de 20 mil jovens e adultos. Ademais, há a formação de técnicos e educadores, em cursos de nível médio e superior.

Desde seus primeiros assentamentos, parte primordial da luta do MST é o estabelecimento de novas relações de produção. Discussões e estudos sobre o desenvolvimento da agricultura no capitalismo permitiram que o Movimento chegasse a um modelo de cooperação agrícola. Não se dissocia a dimensão econômica da dimensão política, isto é, a luta não acaba no momento de conquista de um assentamento, mas se estende para a organização interna às ocupações para que se viabilize esse modelo baseado na cooperação. Assim, podemos compreender que sua ação vai muito além da terra em si, mas se trata de uma luta política, que objetiva acabar com a falácia neoliberal, situar a reforma agrária como conquista que beneficiará não só trabalhadores rurais, mas toda a sociedade, fortalecendo essa militância como condutora de uma luta mais que necessária.

Trazendo sua atuação a pautas atuais, é esse trabalho que viabilizou, no contexto da pandemia de 2020, a doação de mais de 3400 toneladas de alimento para a população em vulnerabilidade social, em um dos momentos mais críticos para a sobrevivência e garantia de recursos absolutamente essenciais. O aumento do preço do arroz na casa dos 20% também escancara a importância de seu trabalho. Justamente por quebrarem a lógica produtiva sedenta por lucro, que é a razão pela qual o grão aumentou de preço em um contexto em que se prefere exportar a produção nacional a garantir o produto ao povo, o saco de cinco quilos do arroz Terra Livre, de produção do Movimento, se mantém ao preço de R$29,90, enquanto outras marcas ultrapassam o valor de R$40 pela mesma quantidade. Com essa crise de abastecimento interno, o MST recebeu propostas de compra da saca por até R$120, o que recusaram, em prol do seu compromisso de fornecer alimento para merenda escolar para prefeituras e garantir a entrega para mercados, feiras e lojas.

Em um momento de mudança de paradigmas que bota em cheque todo o modelo produtivo que sustenta a lógica de centros urbanos e meio rural a seu serviço, fica mais uma vez evidente como sua luta é essencial para toda a sociedade, tanto em prol da tão necessária reforma agrária quanto para o bem estar social e desenvolvimento sustentável por tanto tempo ignorado. Importante ressaltar ainda que suas pautas fundamentais, nessa pandemia, são a garantia de alimento de qualidade a preços acessíveis à toda população sem cessar suas atividades de luta contra o desmatamento e à política de agrotóxicos, cujo único beneficiário é o produtor latifundiário.

Além da luta pela distribuição justa de terras no meio rural, no entanto, há a luta que o MST empreende por espaços dentro de centros urbanos. Se, no meio rural, a luta é contra a concentração fundiária que historicamente assola o país, ela é incorporada também ao meio urbano, frontalmente se posicionando em oposição a um mal quiçá ainda mais danoso: a especulação imobiliária. Se a função social da propriedade é desrespeitada, no meio rural, na forma de terras improdutivas, no meio urbano isso se dá por terrenos e edifícios cujo principal propósito é o da especulação e, em outras palavras, o processo de não inclusão das classes sociais desfavorecidas, que tem como produto a periferização e perpetuação da desigualdade social. Se há de ser um direito essencial que se tenha uma terra para se viver, dentro da lógica das cidades, tem de ser também direito essencial que se possa viver em áreas com oferta de infraestrutura, para que assegure qualidade de vida para o trabalhador. Com mais de mil imóveis ociosos no centro da cidade de São Paulo, é inadmissível que exista uma população de mais de 16 mil pessoas que não têm onde morar e tantas outras com uma jornada de mais de quatro horas diárias gastas apenas no deslocamento para trabalhar; essa é a luta do MTST, em comparação simplista, o “braço urbano” do MST.

Formalmente fundado em 1997, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto atua nas grandes capitais do país, como ação de combate à lógica de privilégios que sustenta a propriedade privada dentro dos centros urbanos. Assim, organiza trabalhadores urbanos a partir das áreas em que vivem: as periferias. Posicionando-se contra o movimento capitalista que rege a vida das cidades, o Movimento estabelece relações entre trabalhadores no âmbito que lhe é possível: sindicatos de trabalhadores de fábricas e empresas. Nesse meio em que tudo, inclusive direitos que deveriam ser universais e inalienáveis, se transforma em mercadoria, o Movimento se compreende como movimento territorial pois, com uma complexidade maior que a do meio rural, a questão não se resume apenas à terra e sua propriedade, mas concerne ao âmbito do pleno direito à cidade, no sentido amplo do termo.

Se é evidente que a reforma agrária é necessidade histórica no Brasil, é também claro que é necessária uma reforma urbana. A lógica capitalista é insustentável, em todos os sentidos da palavra, para a vida. Retomando um comentário já feito, o que falta não é uma determinação legal de instrumentos de bem estar social, mas a sua aplicação prática, o que, pontuemos, só se dá pela ação de movimentos sociais, e o Movimento dos Trabalhadores, sejam Rurais sem Terra, sejam urbanos sem Teto, é a forma de se fazer valer o poder popular com ideais de respeito à vida. Enquanto houver concentração fundiária, há de haver ocupação popular.

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referências bibliográficas

LEITE, Jáder Ferreira; DIMENSTEIN, Magda. Movimentos sociais e produção de subjetividade: o MST em perspectiva. Psicol. Soc.,  Florianópolis ,  v. 22, n. 2, p. 269-278,  Aug.  2010 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822010000200007&lng=en&nrm=iso>. access on  14  Nov.  2020.  https://doi.org/10.1590/S0102-71822010000200007

CALDAR, Roseli Salete. O MST e a formação dos sem terra: o movimento social como princípio educativo. Estud. av.,  São Paulo ,  v. 15, n. 43, p. 207-224,  Dec.  2001. <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142001000300016&lng=en&nrm=iso>. access on  14  Nov.  2020. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0103-40142001000300016>

CARDOSO, Franciele Silva. A luta e a lida : estudo do controle social do MST nos acampamentos e assentamentos de reforma agrária. Tese de doutorado. São Paulo, 2012. Disponível em: < https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-23082013-131951/publico/Franciele_Silva_Cardoso_DO.pdf >

RIOS, Helena Galrão; FERREIRA, João Sette Whitaker. Rural x urbano: perspectivas e antagonismos decorrentes da localização das Comunas da Terra do MST na Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo. Disponível em: < https://www.fau.usp.br/disciplinas/tfg/tfg_online/tr/072/a052.html#top>

Matérias em sites e revistas eletrônicas:

https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-constitucional/a-funcao-social-da-propriedade-rural-e-o-acesso-a-terra-como-respeito-a-dignidade-da-pessoa-humana/

https://mst.org.br/quem-somos/

https://mst.org.br/2020/09/12/em-meio-a-alta-de-precos-arroz-organico-do-mst-segue-a-preco-justo/

https://www.brasildefato.com.br/2020/09/17/como-o-mst-consegue-vender-arroz-a-um-preco-justo-em-meio-a-alta-do-valor

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